Estreei-me hoje no tão badalado Campus da Justiça de Lisboa, no Parque das Nações. Um conjunto de modernos edifícios inicialmente construídos para escritórios, pelo qual o Estado (ou seja, todos nós contribuintes) paga anualmente 12,5 milhões de euros de renda. Não seria este um pormenor a destacar, não fosse o caso de o Estado (ou seja, todos nós) estarmos mal servidos. A sala onde hoje se realizou mais uma sessão de julgamento do processo Casa Pia é minúscula. Tem apenas 12 lugares para a audiência, o que, segundo vários colegas, já obrigou a que vários jornalistas fossem proibidos de assistir às sessões (que se querem públicas). O sistema de som não funciona, o que significa que tudo aquilo que é dito por magistradores, advogados, arguidos e testemunhas não é audível por quem está na audiência (mais uma vez, que se querem públicas). Já não bastavam as precárias condições de segurança em que o juiz Carlos Alexandre trabalhava, e prontamente denunciadas pela comunicação social, no que diz respeito aos jornalistas, as condições de trabalho não melhoraram em nada. E, uma vez mais, o que fica em causa é a Justiça!
Hoje, fez-se história na justiça portuguesa. Em 35 anos de democracia, nunca um político no activo tinha sido condenado a pena de prisão efectiva. Isaltino Morais, o presidente da Câmara de Oeiras, foi hoje condenado pelo Tribunal de Sintra a uma pena de prisão efectiva de sete anos, com perda imediata de mandato, e ao pagamento de 463 mil euros ao Estado por fraude fiscal. O autarca já apresentou recurso para o Tribunal da Relação, pelo que até a sentença transitar em julgado, à luz da lei Isaltino Morais é considerado inocente e um cidadão de plenos direitos.
Para muitos juristas, este é um momento histórico na justiça portuguesa porque, finalmente, um juíz (neste caso, um júri) terá tido "a coragem" de condenar um político no activo a uma pena efectiva de prisão e à perda imedita de mandato. Recorde-se que Valentim Loureiro e Fátima Felgueiras, por exemplo, foram ambos condenados a penas suspensas.
Marques Mendes verá nesta sentença mais um argumento de força à tese quem vem defendendo desde 2005, de que quem esteja a contas com a justiça, mesmo que só indiciado por um qualquer crime considerado grave, não possa ser candidato a qualquer cargo público. Mas a verdade é que a lei permite que tal aconteça e Isaltino Morais já reafirmou a sua recandidatura à presidência da Câmara de Oeiras, nas autárquicas de 11 de Outubro, altura em que se conhecerá a sentença do povo de Oeiras.
Ana Rita, a jovem que acampou e esteve em greve de fome à porta do Tribunal de Cascais, como forma de protesto pelo facto de o seu filho ter sido considerado adoptável, viu recentemente o processo ser revisto e amanhã vai poder visitar Martim no Refúgio Aboim Ascensão, em Faro. Mais: brevemente, a criança será transferida para um centro de acolhimento próximo da área de residência dos pais.
Hoje, uma outra família, desta vez em Coimbra, decidiu seguir os mesmos passos de Ana Rita e acampou e iniciou uma greve de fome à porta do Tribunal de Menores. Também neste caso, a família reclama que uma criança, que foi retirada aos pais por uma situação de alegados maus-tratos entre estes e que foi dada igualmente para adopção, retorne a casa.
O efeito de imitação é por demais evidente. E é por demais preocupante. Por muito que nos garantam que a Justiça é imune à mediatização dos casos, que este tipo de comportamento em nada influencia as decisões dos juízes, a verdade é que casos como estes semeiam a dúvida em muitos cidadãos. E não será de estranhar se, cada vez mais, quem está a contas com a justiça e se sente injustiçado recorra a estes meios para fazer ouvir a sua voz.
Depois de terem perdido os seus entes queridos de forma trágica, de terem visto o tribunal absolver os alegados responsáveis pelo acidente, eis que os familiares das vítimas da queda da ponte Hintze Ribeiro, em Castelo de Paiva, são notificados para pagar custas judiciais no valor de meio milhão de euros. De acordo com a lei, quem perde o processo paga as custas judiciais. Neste caso, além de terem perdido os familiares, viram os seis acusados pelo Ministério Público (que dirigiu a investigação) serem absolvidos e, consequentemente, negada qualquer indemnização. Não houve uma única condenação. Como se a queda do tragicamente famoso Pilar 4 não tivesse tido sinais pronunciadores de que algo não estaria bem na ponte. Resta-lhes apelar à sensibilidade do Governo, que pode criar um regime de excepção. Será que finalmente lhes será feita justiça?
No discurso que ontem proferiu na cerimónia de Abertura do Ano Judicial, o Procurador-Geral da República sublinhou: "Há que afirmar, clara e inequivocamente, que todos são iguais perante a lei, investigando-se eventuais ilícitos sem olhar a quem eles respeitam. Afirmá-lo e praticá-lo".Embora não especificando qualquer caso, está subjacente que Pinto Monteiro fazia referência ao caso Freeport, ao qual se tem associado o nome do primeiro-ministro.
Hoje, a directora do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (que está na dependência do PGR), referindo-se ao caso Freeport, disse que "o processo é urgente" por estarem nomes de políticos associados. "Todos os (processos) de políticos têm de ser rápidos, porque são cidadãos que são o nosso espelho e vão intervir sobretudo neste ano de campanhas eleitorais", afirmou Cândida Almeida.
E eu que, ingenuamente, sempre pensei que somos todos iguais perante a lei e que os tempos da investigação criminal e da justiça não se regiam pelos tempos eleitorais. Afinal, parece que estava enganada!
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